Pesquisadores identificam que o medicamento, já aprovado para outras condições, pode ter efeito antitumoral em casos de glioblastoma.
O glioblastoma multiforme (GBM) é o tipo mais comum e agressivo de tumor cerebral primário em adultos, caracterizado por rápida progressão e baixa taxa de sobrevida. Recentemente, estudos conduzidos por pesquisadores do Mass General Brigham e da Universidade da Califórnia em São Francisco (UCSF) sugerem que a gabapentina, um medicamento aprovado pela FDA para tratamento de epilepsia e dor neuropática, pode estar associada a um aumento significativo na sobrevida de pacientes com GBM.
Estudos retrospectivos indicam benefício na sobrevida
Em uma análise retrospectiva de 20 anos envolvendo 379 pacientes com GBM tratados na UCSF, 36 pacientes que receberam gabapentina apresentaram uma mediana de sobrevida de 20,8 meses, em comparação com 14,7 meses nos pacientes que não utilizaram o medicamento. Essa diferença foi estatisticamente significativa (p=0,02), e a análise multivariada indicou que o uso de gabapentina foi associado a uma redução de 33% no risco de morte (HR 0,67, p=0,030).
Além disso, os níveis séricos de trombospondina-1 (TSP-1), uma proteína sinaptogênica envolvida na progressão do GBM, foram significativamente menores nos pacientes tratados com gabapentina (10.181 ng/ml) em comparação com os controles (17.015 ng/ml, p=0,017). A TSP-1 tem sido associada à invasão tumoral e à formação de conexões sinápticas entre células tumorais e neurônios, facilitando o crescimento do tumor.
Resultados pré-clínicos corroboram os achados clínicos
Estudos pré-clínicos em modelos murinos de GBM demonstraram que a gabapentina pode inibir a atividade sináptica aberrante induzida pelo tumor, reduzindo a expansão tumoral e preservando as funções cognitivas. Esses achados sugerem que a gabapentina interfere na comunicação entre as células tumorais e o tecido neural circundante, interrompendo um ciclo de retroalimentação que promove o crescimento do GBM .
Implicações e perspectivas futuras
Embora os resultados sejam promissores, os pesquisadores enfatizam que os estudos realizados até o momento são retrospectivos e observacionais. Portanto, são necessários ensaios clínicos prospectivos e randomizados para confirmar a eficácia da gabapentina como terapia adjuvante no tratamento do GBM. Atualmente, a UCSF está planejando estudos adicionais para investigar o papel da gabapentina e da TSP-1 na progressão do GBM.
O Dr. Joshua Bernstock, coautor do estudo e pesquisador clínico no Departamento de Neurocirurgia do Brigham and Women's Hospital, destacou a importância de explorar novas abordagens terapêuticas para o GBM, uma doença que permanece desafiadora apesar dos avanços na oncologia.
A gabapentina, devido ao seu perfil de segurança conhecido e à ampla disponibilidade, representa uma candidata promissora para estudos futuros que visem melhorar os desfechos clínicos em pacientes com glioblastoma.
Da Redação CSFM
Referências:
- Mehari M, Ambati V, Krishna S, et al. Can targeting TSP-1 with gabapentin enhance survival in glioblastoma? A 20-year retrospective cohort study. Journal of Clinical Oncology. 2024;42(16_suppl):2048.
- Krishna S, Choudhury A, Keough MB, et al. Glioblastoma remodeling of human neural circuits decreases survival. Nature. 2023.
- Hervey-Jumper SL, Krishna S. Scientists Discover a Deadly Brain Cancer’s Hidden Weakness. UCSF News. 2023